Críticas – Pódio para Todos (2020), Olympia – Partes 1 e 2 (1938), O Triunfo da Vontade (1934), Paratodos (2016).

A história dos Jogos Paralímpicos

O tema da Cerimônia de Abertura dos Jogos Paralímpicos (2020) foi a aviação e o vento, lembrando a animação Vidas ao Vento, condizente com o lema dos jogos “Espírito em movimento”, o qual desde a Gênese bíblica pairava sobre a face das águas. O documentário Pódio para Todos (Rising Phoenix) contou com a participação de nove atletas, dois membros do Comitê Paralímpico Internacional e a filha do criador dos jogos Ludwig Guttmann: desde a primeira competição entre os mutilados que serviram o Exército britânico no campo de batalha, até a Rio 2016.

Guttmann era um dos melhores neurocirurgiões da Alemanha em 1936, o mesmo ano da Olimpíada de Berlim, cujo documentário Olympia – Partes 1 e 2 (1938) retrata a glória do algoz de Hitler, Jesse Owens, vice-atleta do século XX atrás de Pelé. Com destaque aos corpos perfeitos em close, inspirado nos deuses e atletas nus dos primeiros jogos da Grécia Antiga. Leni Riefenstah também dirigiu outro documentário de propaganda nazista três anos antes. O Triunfo da Vontade (1935) ilustra a ascensão do Partido Nacional Socialista sob olhares extasiados de milhares de proletariados do campo o qual aplaudiam de cabeça erguida sem ao menos raciocinar o conteúdo totalitário do discurso do Führer.

Ludwig Guttmann, nasceu numa família judia-ortodoxa do município de Tost, Silésia (hoje Toszek, Polônia). Aos 17 anos começou a trabalhar como voluntário no Hospital de Acidentes de Konigshutte onde manteve o primeiro contato com um paciente com paraplegia por lesão da medula espinhal. Com a chegada dos nazistas ao poder, o então diretor do Hospital de Breslau ficou impedido de exercer a profissão plenamente, atendendo apenas a judeus. Em dezembro de 1938, o ministro alemão de Relações Exteriores, Von Ribbentrop, ordenou ao médico judeu que fosse a Lisboa para tratar de um amigo do ditador António Salazar. Na viagem de volta, recebeu autorização para passar dois dias na Inglaterra: e como já estava em contato com a Sociedade Britânica para a Defesa da Ciência e da Aprendizagem, recebeu uma bolsa como refugiado; ficando por lá com a esposa e os dois filhos. Em setembro de 1943, o pai de Eva Loeffler, uma das depoentes do documentário Rising Phoenix, reinicia suas pesquisas sobre lesões da medula espinhal no Centro Nacional de Lesões da Coluna do Hospital Stoke Mandeville, em Buckinghamshire. O fundador do Movimento Paralímpico, como diretor dessa instituição especializada após acolher muitos mutilados de guerra e jovens com paralisias, constatou que elas estavam condenadas a viver presas à cama ou a aparelhos que as impediam de se locomover: sujeitas a sofrer infecções ou a entrar em depressão profunda. Determinado a reverter esse quadro macabro que matava 18% dos pacientes, o futuro Pai do Paradesporto, motivou a sua equipe a utilizar a fisioterapia como tratamento médico, incluindo um treinador contratado para estimular os exercícios dos membros superiores: inicialmente com arremesso de bolas, de modo a melhorar a resistência física e a autoestima. Um caso que ganhou repercussão na época foi o de um veterano da Primeira Guerra Mundial: depois de ter passado 26 anos acamado, voltou a andar em seis meses com o auxílio de bengalas. Em 28 de julho de 1948, um dia antes das primeiras olimpíadas de verão após o recesso de 12 anos, provocado pela Segunda Guerra Mundial, o médico alemão organizou uma competição a apenas 56 quilômetros dos Jogos Olímpicos de Londres entre 14 homens e duas mulheres, no qual chamou de Jogos Paraplégicos: com modalidades de arco e flecha e basquetebol em cadeiras de rodas. Em 1949, a competição foi ampliada para 37 atletas de seis hospitais. Em 1951, os jogos já incluíam quatro esportes e 126 participantes de 11 hospitais de todo o Reino Unido. A primeira edição com participação internacional foi a de 1952, pelo hospital de veteranos de Aardenburg (Países Baixos). Três anos depois, em 1959, os jogos tinham crescido para 360 competidores de 20 países, e um ano depois, em 1960, os então denominados Jogos Internacionais de Stoke Mandeville foram realizados de forma oficial em Roma, junto da Olimpíada; por isso são considerados os primeiros Jogos Paralímpicos da história, embora o termo tenha sido adotado apenas em 1984. Pela primeira vez fora da Inglaterra, cerca de 400 atletas vindos de 23 países competiram na capital da Itália em oito esportes, seis dos quais ainda hoje fazem parte da programação: como tênis de mesa, arco e flecha, basquetebol, natação, esgrima e atletismo. Quatro anos mais tarde, a competição paralímpica na Cidade do México foi transferida para Tel Aviv, em Israel, por falta de acessibilidade. A exemplo das Paralimpíadas de Munique em 1972, sediadas na Universidade de Heidelberg: uma cidade independente alemã no estado de Baden-Württemberg. Diferente da antiga União Soviética em 1980 ao se recusar a sediá-los, negando a existência de qualquer “inválido” por lá. No entanto, em Londres 2013, a Rússia ficou em segundo lugar no quadro de medalhas, mas no Rio, onde o evento quase foi cancelado pela falta de dinheiro, a delegação olímpica e paralímpica da Rússia foi banida até 16 de dezembro de 2022, envolvida no maior escândalo de doping da história. Ao contrário da paralimpíada chinesa de 2008 que serviu de estímulo para acabar de vez com a segregação existente no país comunista, tornando-se atualmente a maior potência paralímpica, muito à frente da Grã-Bretanha e dos EUA. O documentário Rising Phoenix, mencionado na Festa de Encerramento da Olimpíada de Tokyo, conta a trajetória de nove atletas, alguns com má formação congênita, outros sofreram algum acidente ou foram vítimas de alguma doença ao longo da vida.

Ao contrário dos atletas olímpicos, não existem dois corpos iguais entre os paratletas, conclui Tatyana McFadden, detentora de 17 medalhas no atletismo: dos 100 metros a maratona, além de uma medalha de prata no esqui cross-country nos Jogos de Inverno em 2014, na Rússia, o seu país natal.

Porém, o depoimento do saltador em distância, naturalizado francês, Jean-Baptiste Alaize, foi o mais surpreendente por ter testemunhado o assassinato da própria mãe e a amputação da sua perna direita aos três anos de idade durante o conflito armado no Burundi, em 1994, provocado pelos hutus, visando exterminar as famílias tutsis reprodutivas: “Eles me deram um golpe de facão nas costas, no braço e na perna e me deixaram ali para morrer, mas eu sobrevivi.” Depois de alguns anos em um orfanato, o garoto com deficiência física foi adotado por uma família francesa e se mudou para Montelimar, na França, em 1998.

O título em português: Pódio para Todos (Rising Phoenix) homenageia o documentário brasileiro de 2016, “Paratodos“, com destaque ao campeão paralímpico de 2013, Alan Fonteles ao superar o mito Oscar Pistorius nos 200 metros rasos. Destaque também à sua colega de baixa-visão, Terezinha Guilhermina, campeã nos 100 e 200 metros em Londres; ao multicampeão de canoagem, o ex-BBB, Fernando Fernandes e o seu colega hilário, Cowboy Ruffino. Principalmente ao maior atleta paralímpico da história, o nadador Daniel Dias e a emocionante disputa entre os atletas cegos do Brasil contra a Argentina no Mundial de Futebol Masculino de Cinco, em 2014. 

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Pódio para Todos Título Original: Rising Phoenix Duração: 106 minutos Ano produção: 2020 Estreia: 26 de agosto de 2020 Distribuidora: Netflix Dirigido por: Ian Bonhôte, Peter Ettedgui Classificação: 14 anos Gênero: Documentário, Esporte Países de Origem: Reino Unido

Olympia – Partes 1 e 2 (1938) Olympia 1. Teil – Fest der Völker; Olympia 2. Teil – Fest der Schönheit, Leni Riefenstahl, 1938)

O Triunfo da Vontade (1935)O TRIUNFO da Vontade. O legendário documentário Nazista sobre o Terceiro Reich em Nuremberg. Produção: Leni Riefenstahl. Fotografia: Siegfried Weiman, Werner Hundhausen e outros. Roteiro: Leni Riefenstahl e Walter Ruttmann. Direção: Leni
Riefenstahl. Participação de Adolf Hitler; Alfred Rosenberg; Fritz Reinhardt; Hans
Frank; Heinrich Himmler; Hermann Göring; Hjalmar Schacht; Josef Goebbels e Otto
Dietrich. Local: Nuremberg. Ano: 1934. 1 DVD docum.

Paratodos (Brasil, 2016), de Marcelo Mesquita.Documentário.110 min

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