Críticas — 12 Homens e uma Sentença (1957), O Oficial e o Espião (2019), Testemunha de Acusação (1957), Questão de Honra (1992)

O princípio da presunção de inocência como alicerce da justiça

“A vida está nas suas mãos e a morte em sua mente”. O melhor filme de tribunal de todos os tempos foi o primeiro na carreira de Sidney Lumet, baseado na série homônima de TV em 1954 onde o diretor de “Um Dia de Cão” ganhou experiência a fim de colocá-la em prática nas telonas com apenas 20 dias de filmagens e a bagatela de 337 mil dólares no orçamento.

12 Homens e uma Sentença (1957) beira a perfeição quanto ao cenário, a movimentação de câmera, design de produção e direção de atores. No dia mais quente do ano em Nova York, doze homens comuns de profissões e opiniões distintas, reúnem-se numa sala abafada, ansiosos para voltar às suas casas; caso o arquiteto de comportamento socrático (Henry Fonda) não pensasse em discutir um pouco mais aquela demanda, em vez de condenar sumariamente o réu à cadeira elétrica por homicídio premeditado; afinal, “não se decide a vida de alguém em 5 minutos”. Dessa forma, os outros 11 jurados ganharam tempo suficiente para colocar a cabeça no lugar, e assim, diminuir o preconceito social ao acusado de matar o próprio pai, conforme apareciam dúvidas razoáveis e argumentos racionais, capaz de absolvê-lo. O principal deles foi a deficiência visual da única testemunha ocular do caso, já que a outra testemunha mancava o suficiente para o flagrante delito. Além disso, o autor da facada não possuía nenhuma habilidade com aquela arma branca; e ainda voltou à cena do crime desesperado para reavê-la. Ao contrário do porto-riquenho de apenas 18 anos que já havia sido preso por tentar esfaquear outro garoto.  

Um espião militar judeu a serviço dos alemães? Essa piada pronta se tornou a maior fraude judiciária da era moderna. De acordo com o livro: Un secret bien gardé (de Jean Doise — especialista em História Militar) os oficiais franceses do Estado-Maior usaram um bode expiatório judeu em 1894, aproveitando a onda de antissemitismo que assolava toda a Europa, com intuito de desviar a atenção dos alemães de um novo canhão francês muito mais potente. Alfred Dreyfus era francês, nascido na Alsácia, anexada pela Alemanha em 1871, membro de uma família de industriais judeus da Renânia, cujo documento falsificado por Charles Esterhazy foi encontrado no cesto de lixo pela faxineira Marie Bastian; provavelmente uma agente infiltrada pelo SR na embaixada alemã em Paris. Rui Barbosa foi um dos primeiros a sair em defesa do réu condenado à prisão perpétua, que já apodrecia na Ilha do Diabo, a mesma de Papillon.

O Oficial e o Espião (2019) relata com maestria todas as fases desse processo judicial sob a ótica do coronel Georges Picquart, recém promovido a chefe da divisão de inteligência do exército francês (SR). Picquart (Jean Dujardin) foi o responsável pela reviravolta no caso com a ajuda do irmão de Dreyfus, Mathieu, e da famosa carta: “J’ccuse”, escrita por Émile Zola, culpando o alto escalão do exército francês pela falsa acusação ao Capitão Dreyfus (Louis Garrel); o mesmo título original do longa de Roman Polanski. Zola morreu asfixiado ao exalar fumaça da chaminé de sua casa; tampada misteriosamente.

Agatha Christie já vendeu mais de 4 bilhões de cópias em 103 idiomas diferentes, atrás apenas de William Shakespeare. Assim como Jane Austen e Tolkien, a “Dama do Crime” foi alfabetizada em casa. Testemunha de Acusação, publicado em 1925, revela como a justiça é falha e facilmente manipulável sem o detetive Hercule Poirot por perto. A adaptação de Billy Wilder em 1957 adota um tom mais cômico em relação ao conto; por isso, quem roubou a cena foi a graciosa enfermeira Plimsoll (Elsa Lanchester) e o seu excêntrico paciente, Sir Wilfrid Robarts (Charles Laughton), enquanto se recuperava de um ataque cardíaco quando assumiu o caso como advogado de defesa do réu. Na trama, a adorável Emily French (Norma Varden) é uma viúva rica, assassinada brutalmente com um golpe da cabeça, cujo principal suspeito é o único herdeiro. Acontece que o álibi de Leonard Vole (Tyrone Power) é a sua própria esposa nascida da Alemanha Oriental. Christine Helm é uma comunista desequilibrada vinda do “Inferno” para fazer jus ao sobrenome.

É possível cometer injustiças legais?  Como respeitar a lei escrita sem ter questionamento moral? A obediência irrestrita ao superior hierárquico deve ser cega a ponto de tirar uma vida? Questão de Honra (1992), dirigido por Rob Reiner e roteirizado por Aaron Sorkin foi baseado na sua peça teatral homônima, anterior à queda do Muro de Berlim, ambientada na Base Naval de Guantánamo a 250 metros de Cuba, cujo clima tenso da Guerra Fria transparecia na face autoritária do Coronel Nathan Jessep (Jack Nicholson), cujo diálogo entre Daniel Kaffee (Tom Cruise) tornou-se um dos mais famosos do cinema: ”Você não aguentaria a verdade! Filho, o mundo tem muros, os quais precisam de sentinelas armadas. Minha responsabilidade é maior do que vocês podem imaginar!” “E minha existência, embora grotesca e inexplicável para você: salva vidas!” ”Você não quer a verdade porque um lado seu que você esconde quer que eu vigie aquele muro; precisa que eu vigie aquele muro. Nós usamos palavras como: honra, código, lealdade, como a base de uma vida empenhada em defender algo! Você as usa em frases de efeito. Eu não tenho tempo nem disposição para me explicar a alguém que vive sob o manto da liberdade que eu proporciono, e questiona a maneira pela qual eu a proporciono!”

Kaffee pisou num tribunal militar pela primeira vez ao assumir a verdadeira vocação do advogado em vez de abafar o caso com um acordo judicial, graças a investigação da Capitã Joanne Galloway (Demi Moore), obrigando-o a quebrar a hierarquia uníssona das forças armadas: unidade, tropa, pátria e Deus, de modo a conhecer a verdade a fim de se chegar à justiça.

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