O Autêntico Senhor dos Anéis
O Senhor dos Anéis (1954 – 1955) foi o quarto livro mais vendido no mundo, atrás somente de História em Duas Cidades (1859), Dom Quixote (1612) e a Bíblia; enquanto O Hobbit (1937) ficou em 7.º lugar. O maior escritor do século XX nasceu em Bloemfontein na África do Sul e aos 3 anos mudou-se para a Inglaterra após a morte do pai, quando começa de fato a sua jornada mitopoética. Aquela vida rural em Sarehole ao sul de Birmingham, inspirou o Condado dos Hobbits: um lugar arborizado onde Tolkien (2019), andava descalço em contato com a natureza, canalizando a energia da terra, de onde vieram as criaturinhas fantásticas; apegadas ao amável lar, ao trabalho manual e corriqueiro; principalmente a comida apetitosa preparada com muito esmero para dormir de barriga cheia numa cama aconchegante. A mãe virou católica após se converter em 1900, e por isso perdeu a ajuda financeira da família anglicana. Contudo, em homeschooling, aquele garoto esforçado aprendeu grego e latim com ela: sua maior inspiração na vida, cujo sacrifício em alimentá-lo deixou Mabel Suffield desnutrida, agravando sua diabete aguda sem tratamento na época até a morte. Sem um lar, o Padre jesuíta Francis Xavier Morgan (Colm Meaney) o aloja prontamente junto ao irmão na mansão de uma bondosa senhora, especializada em acolher órfãos, onde J. R. R. Tolkien (Nicholas Hoult) conhece Edith Bratt (Lily Collins) em 1908. Aos cuidados daquele padre disciplinador, o jovem de 16 anos ficou proibido de namorar a futura esposa protestante antes de completar os estudos, aos 21 anos. Em 1916, o marido da católica convertida por ele fez questão de participar da Batalha do Somme, na Primeira Guerra, e com 15 línguas na bagagem, incluindo o Esperanto, o soldado chega àquele ambiente macabro que inspirou Mordor, enquanto os companheiros leais do Front inspiraram o amigo de Frodo (Elijah Wood), Sam (Sean Astin). Em 1930, o professor de Oxford e seu colega C. S. Lewis (de As Crônicas de Nárnia), que também participou da Grande Guerra, fundaram o Clube de Chá e Sociedade Barroviana (Inklings), a verdadeira Sociedade do Anel onde travaram uma Guerra do Imaginário (2022) contra dois grandes e respeitáveis amigos membros da Sociedade Fabiana. O filólogo britânico que faleceu em 1973, acreditava que o mito é a representação mais próxima da verdade imutável, enquanto a ciência é uma confrontação de hipóteses, em vez de uma finalidade. Por isso, a ficção deve moldar a nossa realidade, como no longa-metragem A Chegada e na Trilogia Cósmica de Lewis, em homenagem a Tolkien, cujo romance literário virou até música da banda Iron Maiden: “Lewis critica o mito do progresso, o evolucionismo puramente material, imanente, desprovido de qualquer perspectiva transcendente, a técnica e a ciência como fins em si, a ciência sem alma, por assim dizer, que só se preocupa com a matéria, crendo que os fins justificam os meios, dominada que está por uma perspectiva puramente desenvolvimentista e evolucionista.” (Carlos Ribeiro Caldas Filho, doutor em Ciências da Religião). A Sociedade Fabiana foi fundada pelo influente dramaturgo rousseauniano Bernard Shaw em 1893, visando fomentar a evolução progressiva da sociedade rumo ao socialismo, simbolizada pelo lobo na pele de cordeiro, substituído mais tarde pela tartaruga por ter ficado evidente demais. Outro amigo do criador de O Senhor dos Anéis, membro daquela sociedade progressista, foi o pai do globalismo e do cientificismo que levou a fundação das Nações Unidas. As grandes obras literárias de H. G. Wells, fomentaram o uso mais sombrio da tecnologia: a bomba nuclear e as guerras com bombardeios. A imaginação plasmada do autor de A Ilha do Dr. Moreau, traduzida em palavras, fez da ciência uma religião ao transportar o Paraíso até a Terra onde a tecnologia acaba com o sofrimento dos homens. A odisseia de Frodo, em oposição, inicia com o chamamento pelo mago e profeta Gandalf (Ian McKellen) porque Frodo era o único de coração puro capaz de carregar aquele fardo pecaminoso no bolso, análogo ao peso da cruz do Cristo nas costas — inspirado no Anel de Giges e no Anel de Nibelungo, Outrora, Um Anel possuiu Gollum (Andy Serkis), obstinado na infinita fixação monoideística, deformando corpo e mente conforme intensificava o vício. Apesar dos inúmeros erros, Flodo conclui sua missão evolutiva com louvor e sofrimento, acendendo a vida eterna celestial, ao lado dos elfos — longe dos afazeres dos moradores do condado apegados à matéria — agora sob a responsabilidade de Sam após constituir uma nova família. Aragorn (Viggo Mortensen), todavia, desceu à Mansão dos Mortos munido da espada forjada pelos elfos, a fim de libertar espíritos sofredores ligados à matéria. O casamento do Rei dos Homens com a elfa imortal, Arwen (Liv Tyler), representa a união do Cristo com a humanidade na Parábola das Dez Virgens, enquanto Maria de Nazaré e Joana D’arc podem ser aplicadas a figura de Galadriel (Cate Blanchett) e Éowyn (Miranda Otto).