Críticas – Mãe! (2017), Mães Paralelas (2021), A. I. – Inteligência Artificial (2001)

Mãe do início ao fim

“No princípio, Deus criou o céu e a terra”. O céu-masculino acima era ativo, leve e claro; opondo-se ao arquétipo feminino da Terra abaixo: pesada, passiva e escura. No Evangelho segundo Darren Aronofsky, depois de Noé (2014), observamos o planeta Terra (Casa) com o esverdeado Jardim do Éden a sua volta. Lá, Gaia (Hera), a mãe-terra ou simplesmente Mae! (2017), se esforça para manter a Casa em ordem enquanto o marido Deus-Zeus (Javier Bardem) termina a criação. Os três andares da Casa, análogos aos da Arca de Noé, simbolizam o Inferno (porão), o Purgatório (sala e cozinha) e o Paraíso (escritório) onde está guardado as sete chaves o Ovo de Cristal (Fruto Proibido). Eis que surge então o Velho Adão (Ed Harris), moribundo e fumando muito; quando numa crise de tosse Deus bate em sua costela fértil onde circula muito sangue. No dia seguinte é a vez de Eva-Lilith (Michelle Pfeiffer) entrar na Casa bebendo vodca para transar com o velho Adão, quebrar o ovo sagrado e ser expulsa daquele escritório paradisíaco para sempre. No início Gaia (Jennifer Lawrence) circulava à vontade de camisola transparente como se estivesse nua; mas Eva fica incomodada após adquirir o conhecimento do bem e do mal. Já o Dilúvio simboliza a pia se quebrando e o Êxodo quando centenas de pessoas invadem a Casa ao mesmo tempo, transformando aquele lugar num pandemônio como se estivessem adorando o Bezerro de Ouro numa terra infrutífera. Gaia torna-se Maria de Nazaré e o Menino Jesus é agraciado com muitos presentes logo após o nascimento. Isso até o povo invadir o santuário para mata-lo; motivo de reciclar a humanidade novamente a partir do zero. “Ele segurou o dragão, a antiga serpente, que é o diabo, Satanás, e o prendeu por mil anos; lançou-o no abismo, fechou-o e pôs selo sobre ele, para que não mais enganasse as nações até se completarem os mil anos” (Apocalipse 20).

Janis Martínez (Penélope Cruz) e Ana Manso (Milena Smit) tiveram uma gravidez acidental e por isso criaram sozinhas as filhas Cecília e Anita, ambas nascidas ao mesmo tempo na mesma maternidade onde aquelas mães solteiras dividiram o mesmo quarto. Enquanto isso, Arturo (Israel Elejalde), o pai biológico de Cecília, procurava os restos mortais do bisavô de Janis e de outras vítimas da Guerra Civil Espanhola (1936 a 1939), quando os soviéticos bombardearam seus aliados anarquistas, abrindo caminho para o ditador Franco assumir o poder e Hitler invadir a Polônia. A fotógrafa estava satisfeita com a sua gravidez porque tinha condições financeiras de criar a filha sem a ajuda daquele pai desnaturado; ao contrário da adolescente Ana: sem dinheiro e a presença da mãe Teresa (Aitana Sánchez-Gijón) em turnê pelo país atuando no papel principal de uma nova peça de teatro. No final das contas, as Mães Paralelas (2021) acabam se tornando grandes amigas quando integraram a comunidade das vítimas da Guerra Civil Espanhola.  

Brian Aldiss tentou por 30 anos convencer Stanley Kubrick, sem sucesso, a adaptar seu conto: Superbrinquedos Duram o Verão Todo; porém dois anos depois da morte do diretor o longa finalmente  estreou, graças a Steven Spielberg ao capturar a essência do clássico da Disney: Pinóquio. Em  A. I. – Inteligência Artificial (2001) parte do planeta foi inundado pela elevação dos mares: enquanto a água (horizontal) representa a natureza material, o fogo (vertical) é a evolução do Espírito Inteligente; e a cruz a redenção. “Em verdade, em verdade te digo: quem não nascer da água e do Espírito (de corpo e alma) não pode entrar no reino de Deus”. Na trama, David Swinton (Haley Joel Osment) ganha vida pelas mãos do Demiurgo “o deus menor” (William Hurt), embora a Fada Azul, “o Grande Deus”, seja a única capaz de lhe conceder a centelha divina e transformá-lo num menino de verdade com livre-arbítrio: caso  se prove corajoso, verdadeiro e altruísta. Dessa forma, o Pinóquio Cibernético, inicia a sua jornada heroica, convicto de ser um menino de verdade, apesar de ter sido abandonado pela família por um motivo justo. Na Ilha dos Prazeres, a carrocinha dos humanoides, ele encontra um gigolô redimido (Jude Law) que o leva até um oráculo computadorizado (Robin Williams), capaz de indicar a localização exata daquela fada salvadora, mas que renascerá das águas congeladas apenas 2000 anos depois; semelhante à espada Excalibur entregue por Viviane ao rei Arthur. David queria ser amado pela mãe (Frances O’Connor) apenas por um dia até partirem juntos para onde nascem os sonhos.

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